Sino do Museu Histórico é tema de encontro
O sino foi furtado em agosto de 2016, mas seu badalar, simbolicamente, continua sendo ouvido nas esquinas, na rede social, na roda de amigos, conversas de pesquisadores, historiadores e museólogos. No alto da escada do Museu Histórico Anita Garibaldi existia um sino, que supostamente, seria do período colonial de Laguna, por volta do século 17.
Dois anos irão completar em agosto do desaparecimento do objeto. Um espaço vazio ficou e a dúvida do que fazer originou um encontro no Cine Teatro Mussi, nesta quinta-feira, dia 17, intitulado Seminário “Segurança e Ressignificação de Acervo – Estudo de caso “O Sino do Museu”. Com participação da museológa e mestranda em museologia Renato Cittadin; Liliane Monfardini, técnica do Iphan de Laguna; Luciana Silveira, coordenadora do curso de bachalerado em museologia da Ufsc; Elaine Cristina, educadora museal e Carlos Mangili, pesquisador. Com a participão da Associação dos Guias de Turismo de Laguna, vereadores Rodrigo Moraes e Peterson Crippa, estudantes da Udesc e comunidade em geral.
A museóloga Mirella Honorato, da Fundação Lagunense de Cultura, depois de ouvir os questionamentos do público e da mesa de profissionais, irá elaborar uma pesquisa. “O espaço vazio deverá ser preenchido, mas a história do sino não será esquecida. Vamos definir uma proposta, onde o fato será lembrado”, comentou.
Para Mirella, o que ficou claro com o seminário é o interesse da população em colocar algo no local para rememorar a questão que ali houve um sino, furtado por negligência tanto do poder público e da comunidade.
O espaço vai contextualizar o descaso com o patrimônio público histórico. Fato que a equipe da Fundação Lagunense de Cultura e Iphan estão trabalhando para mudar a realidade com ações mais concretas.
– Casa de Anita será revitalizada com uma nova proposta da exposição do acervo;
– Arquivo Público Municipal está sendo reestruturado. O acervo passará por cuidados e voltará para o espaço melhorado;
– Projeto do prêmio cultural Anderle foi selecionado e uma equipe está pesquisando para melhor visualição e comunicação do Museu Histórico Anita Garibaldi com o público;
– A museológa entrou no Governo Municipal há oito meses para atender a necessidade técnica dentro do patrimônio histórico.
Sino tem mais valor agora, do que quando estava lá
A frase acima é do pesquisador Carlos Magili ficou meses percorrendo livros, fotos e arquivos antigos para descobrir a história do sino. Não encontrou muita coisa. Imagens antigas mostram um prédio histórico, sem sino, sem escada e sem sineira.
O museu foi inaugurado na década de 50, em nenhum documento foi encontrado algo específico sobre o objeto. O sino começa a aparecer nas fotos neste período. Num discurso de Rubens Ulyssea no ato de inauguração do museu, ele comenta sobre sinetas doadas pela comunidade, também sino que chamava os vereadores para as sessões, mas nada específico.
O pesquisador concluiu que existe dúvida em relação à originalidade do sino sumido. Porém, um fato ele tem certeza: “Sino tem mais valor agora, do que quando estava lá”, questionou.
Falso histórico
O Iphan de Laguna elaborou um parecer técnico sobre o caso e apresentou no seminário. No documento, elaborado por Liliane Monfardini, a não substituição do sino é enfatizada, o contrário iria ocorrer uma caracterização de um falso histórico.
O objeto roubado possui um valor simbólico para a população lagunense. O sino não se trata de um bem tombado, pois não fora mencionado em nenhum momento no processo de tombamento.
“A instalação de um novo sino, semelhante ao anterior induz ao esquecimento do roubo do sino, que deve ser reconhecido e lembrado por todos como uma ação educativa, sobre a perda de bem com valor simbólico e afetivo, que remetia aos usos e atividades cotidianas do passado”, afirmou.
O Iphan apresentou duas opções:
1 – deixar a sinaleira vazia pelo impacto visual que ela causa, de sensação de perda. Instalar na lateral da sineira uma placa com a informação sobre a história do sino, sua função no período colonial e que, atualmente, o espaço da sineira está vazio em memória do último sino roubado.
2 – mas, se realmente, a população acha necessário incluir um novo sino, que o mesmo seja uma obra composta por outro material e desenho, com data de fabricação, de maneira a deixar claro para qualquer visitante, que trata-se de um novo sino em substituição ao anterior. Uma placa informativa sobre este novo objeto e o fato ocorrido sobre o roubo do sino.
Sobre falso histórico, comentou sobre a Casa de Anita, onde muitos acreditam que ela morou no local, mas a história relata que apenas se vestiu para o casamento com o Manoel dos Cachorros.
Mostrou exemplos pelo mundo e no Brasil de intervenções, onde não foram descaracterizadas a história do prédio.
Museóloga
A coordenadora do curso da Ufsc, Luciana Silveira, ao apresentar o tema “Segurança e Preservação do Acervos”, questionou a realidade sobre o assunto, onde a falta do sino para a museóloga faz mais sentido. Ela defendeu a ideia da conservação efetiva do acervo. “O roubo foi um alerta para a falta de segurança. Será que o sino deveria estar lá todo este tempo ?”
Numa escala de falta de segurança, o sino estava em primeiro lugar. Mencionou a urgência de um inventário, pois nos documentos do acervo do museu pesquisado, não existe escritos e nem fotos do sino. “É preciso conhecer o acervo e pensar mais sobre ele”, apontou e afirmou “todo o pessoal faz parte do sistema de segurança”.
A educação patrimonial não é passada apenas para as crianças e adultos, mas sim, para quem trabalham no acervo.
“Como um sino foi furtado e ninguém viu ?”, ela deixou a pergunta no ar.
Mascarar
Gestão de patrimônio é um problema patológico, uma doença, segundo Renata Cittadin, museóloga e diretora do Museu Nacional da Imigração em Joinville.
Para ela, o sino está em algum lugar. O furto é reflexo da má gestão de vários governos com muita negligência.
“Será que colocar o outro sino não é mascarar uma situação ? É um sino mesmo que está fazendo falta ?” filosofou.
Depoimentos fervorosos
A educadora museal, Elaine Cristina, que o poder público deva assumir que furto aconteceu, pois ele já faz parte da história do sino.
Observou na mídia e ao vivo da plateia, depoimentos fervorosos e manifestações emocionadas sobre o objeto que tem um valor simbólico para os lagunenses.
Explicações sobre signo e significados apresentou pois acredita que devem ser levados em conta.
“O que fica com a história do sino ? Na memória fica o que significa”, encerrando a sua fala.
Novo olhar sobre o caso
O presidente da Fundação Lagunense de Cultura, Márcio José Rodriguês Filho, explicou sobre a importância da contratação de uma museóloga pela primeira vez no Governo Municipal para planejar e administrar os acervos de Laguna.
A importância do seminário, coragem em colocar um novo olhar sobre o caso estavam na sua fala.
A intenção foi desmitificar muitos “achismos e não competência técnica para comentar o assunto” foram a razão para o convite de profissionais sobre o assunto.
“Entendemos que a substituição seja uma cortina de fumaça. Temos consciência disso”, apontou.
Todas as sugestões ouvidas foram válidas e o espaço será ocupado por outra tipo de intervenção para a história real do sino não ser esquecida.
Texto: jornalista Taís Sutero SC 1796