Data para renovar a fé e a esperança

Em 2021, um ano de pandemia, Laguna não terá a tradicional procissão de Nossa Senhora dos Navegantes e rodas de giras para Iemanjá na praia do Mar Grosso.

 

Neste dia 2 de fevereiro, uma pequena missa com número reduzido de fiéis está programada, ás 19h, na igreja Nossa Senhora dos Navegantes. Na beira-mar não ocorrerá a festa para Iemanjá. Tudo para evitar aglomerações.

 

 

 

Nossa Senhora dos Navegantes

 

  

Desde a década de 60, a procissão de Nossa Senhora dos Navegantes é tradição no mês de fevereiro. Em tempos de coronavírus, o evento foi cancelado. Os fiéis poderão assistir uma missa em homenagem a padroeira do bairro Magalhães, às 19h, com a participação do bispo Dom João. Os espaços serão demarcados e o uso da máscara é obrigatório na igreja. O público também poderá assistir a missa pelo facebook da paróquia do Magalhães.

 

 

“Vou rezar de casa. A fé não vai mudar”, disse a aposentada Adélia Silva, 78 anos. O neto coloca na rede social da paróquia e ela acompanha a missa com o rosário nas mãos.

 

 

Dia de Iemanjá

 

 

Laguna tem fortes ligações históricas com a África, por aqui, na época da escravidão, o antigo porto era um ponto de distribuição de escravos para a região.

 

Somente no ano de 1860, a província de Laguna tinha 33.432 mil habitantes, sendo 3.310 mil escravos. Estes homens e mulheres trouxeram a sua religiosidade.

 

Seus descendentes, mesmo com o passar dos séculos, não esqueceram das suas crenças e sua fé atravessou gerações. Em 2017, o município reconheceu a importância desta história decretando o dia 2 de fevereiro, data para lembrar de Iemanjá, orixá muita cultuada, mãe da sabedoria e dona do pensamento dentro da religiosidade africana.

 

A intenção é contribuir com o avanço da tolerância religiosa.

 

O Dia de Iemanjá é considerado patrimônio imaterial, segundo a presidente do Conselho Municipal de Políticas Públicas Culturais, a professora Juliana Regazoli, as celebrações e tudo que envolve o culto a mãe das águas também.

 

O pai de santo Fabrício de Iansã lembra que neste período do ano “pedimos amor, carinho e proteção. Trazer toda essa cura. Nós precisamos mais de afeto e Iemanjá é mãe”.

 

 

História africana em Laguna

 

 

Antes de virem para o Brasil, os africanos cultuavam diferentes orixás em diversas regiões da África. Quando chegaram na América do Sul foram proibidos de realizar cultos.

 

Para driblar a proibição, os escravos associaram os orixás aos santos da igreja católica, o chamado sincretismo religioso.

 

Iemanjá, a Rainha dos Mares, foi sincretizada com Nossa Senhora dos Navegantes.

 

Tradicionalmente, há muitos anos, turistas, praticantes e admiradores de religiões africanas se reúnem na praia do Mar Grosso para agradecer e homenagear Iemanjá, tanto no dia 2 de fevereiro, como na passagem do primeiro do ano.

 

 

Centros de cultos religiosos

 

 

Em Laguna, são aproximadamente dez centros de cultos religiosos com matriz africana.

 

Outros, pequenos grupos anônimos, com receio do preconceito, realizam suas atividades na sala de casa, para poucos amigos. As primeiras manifestações religiosas africanas ocorreram no século 18, na Irmandade de Nossa Senhora do Rosário, fundada por escravos.

 

A construção da igreja da irmandade no centro histórico começou em por volta de 1845, com poucos recursos, demorou mais de 10 anos para ficar pronta. O livro de Nail Ulysséa (1976) descreveu: “Esta irmandade teve a sua época áurea no tempo da escravidão. Fazia a festa da padroeira, de grande fama, em cuja festa se podia sentir em todo o ritual, o sabor das coisas africanas. Nela figurava um rei e uma rainha, com seus respectivos vassalos”.

 

Acabada a parte religiosa, entregavam-se a danças trazidas da África, que duravam até altas horas da noite. O rei da primeira festa realizada em 1836, foi o escravo liberto Francisco Vaga e a primeira rainha foi Josefa, escrava de José Lourenço. Esta primeira festa foi oficiada pelo vigário Francisco Vilela, que, em 1839, foi morto pelos farrapos.

 

Coincidências históricas, a poucos metros do antigo local da igreja do Rosário, espaços de adoração aos orixás podem ser encontrados atualmente.

 

A igreja foi destruída na década de 30 para construção de casas. Atualmente, apenas pode ser encontrada em fotos. Outras sociedades baseadas em laços de parentesco e de raça surgiram na Laguna no período do pós-abolição.

 

Com destaque para a Sociedade Recreativa União Operária (1903) e o Clube Literário Cruz e Souza (1906), assim como, o bloco carnavalesco Brinca Quem Pode (1947), agremiações que possuem, de alguma forma, ligações ancestrais com o povo do Rosário.

 

 

Negros movimentaram a economia

 

Entre 1822 e 1826, um dos mais importantes traficantes da rota Rio de Janeiro-Moçambique, Zeferino José Pinto de Magalhães, despachou em várias viagens mais de 40 escravos do porto do Rio de Janeiro para Laguna. A maior parte da mão de obra escravizada trabalhava na “lavoura”.

 

Na província de Laguna as propriedades rurais tinham em média entre dois e dez escravos.

 

Na cidade eles exerciam diversas atividades: eram trabalhadores domésticos, cozinheiros e ambulantes, mas também, podiam ser artesãos que confeccionavam vestimentas ou trabalhavam na construção das edificações.

 

Seus afrodescendentes mantiveram os hábitos e cultos da religiosidade africana.

 

 

Protetora das tempestades 

 

 

No bairro Magalhães, comunidade próxima ao porto de Laguna, realizava uma procissão marítima pelo canal da Barra. Foi cancelada devido à pandemia. 

 

O motivo da adoração iniciou no século 18, onde as pessoas que viajavam pelo mar pediam proteção à Nossa Senhora para retornarem aos seus lares. Maria era vista como protetora das tempestades e demais perigos que o mar e os rios ofereciam.

 

A primeira estátua foi trazida de Portugal junto com os navegadores para o Brasil. A região do Magalhães sempre foi envolvida com o porto da cidade, muitos trabalhadores e diretores moravam no bairro.

 

No ano de 1911, para aproximar o povo ainda mais com a religiosidade, foi erguida a Capela de Nossa Senhora dos Navegantes e teve sua pedra fundamental lançada em dia 5 de novembro daquele ano. A construção da Capela contou com o patrocínio do superintendente do Porto da Laguna, engenheiro Polidoro Santiago. Já em 1912, houve a primeira festa de Nossa Senhora dos Navegantes com grande número de fiéis que acompanharam a imagem da padroeira. A primeira missa realizada na Capela foi celebrada no dia 25 de dezembro de 1913.

 

Em 24 de fevereiro de 1966, foi criada a Paróquia Nossa Senhora dos Navegantes, pelo Decreto nº 21, assinado pelo bispo Dom Anselmo Pietrulla. Somente em 1967 foi construída a Casa Paroquial, sendo seu primeiro vigário o Padre Vandelino Shlickmann.

 

Em 1968 realizou-se a primeira Festa de Nossa Senhora dos Navegantes, como paróquia. No dia 1º de maio de 1969, foi colocada a pedra fundamental para a construção da nova matriz, que teve seu início em 16 de maio do mesmo ano, sendo inaugurada no dia 27 de janeiro de 1979. 

 

 

 

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